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Linchar para monetizar: o caso da estilista Juliana

  • Foto do escritor: Rey Aragon
    Rey Aragon
  • há 11 horas
  • 12 min de leitura

Juliana Santos em ré sem defesa. O que começou com um entrevero comercial virou linchamento digital, com rage baiting, doxxing, assédio e monetização do ódio

Abertura


Enquanto o país acompanhava a formalização da denúncia contra Jair Bolsonaro por liderar uma organização criminosa com plano de golpe de Estado, que incluía a tentativa de envenenamento do presidente Lula, do vice-presidente e até de um ministro do Supremo Tribunal Federal, a internet seguia em outro compasso. Na arena paralela das redes, contabilizavam-se não páginas de inquéritos, mas horas e horas de vídeos, transmissões e cortes dedicados a uma única personagem: Juliana Santos, estilista de vestidos de noiva, que viu sua trajetória ser transformada em espetáculo de linchamento digital.

Juliana começou a carreira em Goiânia e rapidamente encontrou nas redes sociais um espaço para mostrar seu trabalho. No Instagram passou a publicar bastidores de ateliê, provas de vestidos e desafios criativos. O carisma diante das câmeras, aliado à proposta de noivas que fugiam do tradicional, garantiu um público crescente. Em pouco tempo foi chamada de a estilista mais querida do Brasil, reunindo milhares de seguidoras e gerando filas de interessadas em experimentar a experiência de um vestido feito sob medida.

A exposição trouxe convites da televisão. Ela participou de programas de grande audiência que exploraram sua história pessoal, marcada por deficiência física desde a infância. A narrativa capacitista de superação, que misturava esforço, criatividade e sensibilidade artística, ajudou a construir a imagem de uma jovem estilista que transformava dificuldades em combustível para a criação. O enquadramento como mulher com deficiência em um setor competitivo reforçava sua singularidade e despertava empatia, servindo como diferencial de marketing e também como passaporte para conquistar clientes em várias regiões do país.

A visibilidade, no entanto, também abriu espaço para denúncias. Em 2018, uma reportagem da TV Anhanguera exibiu acusações de noivas que diziam não ter recebido os vestidos contratados. Pelo menos 14 clientes disseram ter registrado boletins de ocorrência na Delegacia do Consumidor de Goiânia. A cobertura mostrou relatos de prejuízos, incluindo uma noiva que cancelou o casamento e outra que precisou se casar com um vestido alugado às pressas. Na mesma ocasião, Juliana declarou à emissora que havia atendido mais de 350 clientes em três anos de carreira, mas a matéria sensacionalista consolidou o primeiro grande abalo em sua reputação pública.

O episódio que parecia restrito ao noticiário local acabou servindo de combustível para a dinâmica das redes. Anos depois, perfis anônimos no TikTok e no Instagram resgataram aquelas denúncias e começaram a compilar novos relatos, prints e comprovantes de pagamento. O perfil batizado de vítimas da estilista funcionava como um arquivo coletivo e deu fôlego a uma narrativa que transformou Juliana em personagem permanente de polêmicas. A estilista deixou de ser apenas profissional de vestidos de noiva e passou a ocupar o lugar de figura pública controversa, envolta em disputas que iam muito além de questões contratuais.

Foi nesse contexto de desgaste e ao mesmo tempo de expansão que Juliana decidiu se mudar para São Paulo. A capital era vista por ela como o maior palco da moda nacional, capaz de oferecer novas oportunidades e visibilidade. A transferência do ateliê foi viabilizada por uma sócia investidora, que custeou a instalação no novo endereço. A expectativa era de recomeço e crescimento, mas a estilista já levava consigo a sombra da polêmica que, nas redes, crescia de forma descontrolada.


O início do linchamento digital


Até 2023, a trajetória de Juliana oscilava entre momentos de grande exposição e fases de instabilidade. O ateliê em São Paulo trouxe novos contratos e uma clientela mais diversa, mas também ampliou a vigilância em torno de sua figura pública. A estilista já não era apenas a profissional que desenhava vestidos, era também personagem que atraía reações extremadas nas redes. Parte de seu público se encantava com os bastidores, os desafios criativos e as histórias de superação. Outra parte alimentava uma audiência menos interessada em moda e mais sedenta por polêmicas.

Nesse cenário, Juliana parecia ter dificuldade em administrar o engajamento que nascia do rage baiting. A cada publicação mais ousada, um corte de vídeo ou uma declaração sobre o mercado de noivas, somava-se uma onda de críticas. Comentários inflamados sobre preço, acabamento e comportamento pessoal passavam a atrair mais curtidas e compartilhamentos do que os conteúdos em que ela mostrava vestidos concluídos ou clientes satisfeitas. O que deveria ser vitrine de trabalho se tornava terreno fértil para a indignação.

Foi nesse ambiente já saturado que surgiu a figura de uma ex-cliente e ex-amiga, jornalista com presença ativa nas redes, que desempenhou o papel de catalisadora. A entrada dela na disputa conferiu credibilidade a um movimento que até então parecia fragmentado em queixas isoladas. Ao dar voz às insatisfações e organizá-las sob uma narrativa comum, abriu espaço para que outras mulheres se sentissem encorajadas a expor suas histórias.

Dessa convergência nasceu o perfil vítimas da estilista, criado no TikTok e no Instagram, que se consolidou como o grande arquivo digital das acusações. Ali eram reunidos prints de conversas, comprovantes de pagamento, vídeos de noivas e cortes de declarações antigas de Juliana. O perfil funcionava ao mesmo tempo como vitrine e fórum, produzindo um fluxo contínuo de conteúdo que mobilizava seguidores a se engajar em comentários carregados de indignação.

A lógica era simples e eficaz. Enquanto Juliana postava vestidos e falas que reforçavam sua identidade artística, o coletivo de críticas oferecia um espelho invertido. A estilista aparecia como antagonista de um drama coletivo, e qualquer gesto seu se transformava em gatilho para novas postagens. Essa engrenagem gerava um efeito de manada. Mulheres que nunca haviam interagido com a estilista sentiam-se parte de uma causa maior ao replicar denúncias, fazer piadas ou gravar reações indignadas.

O resultado foi a transformação do que poderia ser um entrevero comercial em um espetáculo de assédio digital. Juliana não era mais julgada apenas por clientes específicas, mas por uma multidão anônima que se sentia no direito de opinar sobre sua vida, seu corpo, sua saúde mental e até sua condição de pessoa com deficiência. A cada novo vídeo, a estilista se via diante de milhares de comentários que misturavam críticas legítimas a insultos de fundo capacitista.

Esse foi o momento em que o linchamento digital deixou de ser ruído lateral e se impôs como enredo central da vida de Juliana. A dificuldade em administrar o engajamento negativo abriu caminho para que a jornalista e ex-cliente desse forma a um movimento coletivo. A partir dali, a estilista passou a enfrentar não apenas críticas pontuais, mas uma campanha sistemática de exposição e humilhação.


Capacitismo e as cicatrizes na alma


A onda de vídeos e postagens contra Juliana não se limitava a relatar problemas de consumo. Rapidamente, o que estava em jogo já não era apenas a entrega de vestidos, mas a desconstrução da própria imagem da estilista. Esse processo se alimentou de uma dimensão simbólica recorrente em toda a polêmica: o capacitismo.

Juliana carrega marcas visíveis e invisíveis desde a infância. Aos dois anos de idade sofreu um acidente doméstico que queimou mais de 70% do seu corpo. Permaneceu meses internada em um hospital de Goiânia e foi abandonada pela mãe biológica, que não tinha condições de cuidar dela. Foi nesse mesmo hospital que conheceu o homem que se tornaria seu padrinho, responsável por apresentá-la à família adotiva que a criou. Desde então, aprendeu a viver entre cicatrizes físicas e a determinação de não deixar que a dor definisse seus limites.

“Eu conheci pessoas que sempre falaram para mim: você nunca vai conseguir porque você não é uma pessoa completa. Eu nunca liguei para isso, eu sempre fui atrás dos meus sonhos”, contou em uma entrevista, recordando como desde criança enrolava tecidos em bonecas e repetia que queria ser estilista. Sua história, contada em programas de televisão, transformou-se em combustível para o marketing pessoal e também em fonte de inspiração para clientes e seguidores. A jovem que ouvira o não desde cedo passou a ser identificada com o sim conquistado a cada vestido entregue e a cada cliente satisfeita.

No tribunal digital, porém, essa trajetória foi reconfigurada. A deficiência que antes lhe conferia empatia virou alvo de ataques. Nos comentários, multiplicavam-se insinuações de incapacidade, piadas com suas cicatrizes e acusações de que ela explorava sua condição para atrair clientes. A contradição era violenta: o que havia lhe aberto portas passou a ser usado como arma de humilhação.

Esse tipo de violência não atuava sozinho. Ele se somava a uma lógica estrutural da moda que valoriza corpos idealizados e marginaliza os que escapam ao padrão. Juliana não era apenas julgada como profissional, mas como corpo marcado, como mulher que ousava ocupar espaço em um segmento dominado por exigências de perfeição estética. As cicatrizes que narravam sua luta se transformaram, na arena digital, em gatilho para piadas cruéis e em justificativa para questionar sua competência.

O linchamento digital não se restringia, portanto, a contratos, prazos ou acabamentos. Ele se alimentava de uma dimensão simbólica que transformava Juliana em caricatura, desumanizando-a. As narrativas capacitistas não apenas mobilizavam ressentimentos individuais, mas produziam engajamento coletivo. Quanto mais se explorava sua vulnerabilidade, maior era a audiência dos vídeos e das postagens. A lógica do rage baiting encontrava nas cicatrizes da estilista um terreno fértil para manter vivo o espetáculo do ódio.

Essa engrenagem foi decisiva para consolidar o comportamento de manada. Ao repetir ofensas e estigmas, seguidores e seguidoras do perfil vítimas da estilista sentiam-se autorizados a invadir o terreno da intimidade e da humilhação pessoal. O resultado foi a intensificação de um processo de bullying coletivo, em que Juliana deixou de ser vista como indivíduo e passou a ser tratada como personagem descartável, convertida em símbolo de um espetáculo de indignação que pouco tinha a ver com vestidos ou contratos.


O comportamento de manada, o bullying e o assédio digital


O bullying digital assumiu proporções de espetáculo. Reações em vídeo, piadas virais e até músicas parodiadas surgiam como formas de amplificar a humilhação. O algoritmo das plataformas reforçava esse processo. Quanto mais polêmico o conteúdo, mais ele era impulsionado. Assim, mesmo relatos frágeis ou distorcidos alcançavam grandes audiências. Juliana passou a conviver com um tribunal virtual em que a prova importava menos do que a emoção. O ódio coletivo funcionava como combustível para curtidas, visualizações e seguidores.

A escalada não se restringiu ao espaço digital. Aos poucos, o que era ataque em vídeo ou comentário virou perseguição. Juliana relatou a prática de stalking: mensagens de ameaça, invasões de privacidade, trotes telefônicos, doxxing (exposição de dados pessoais) e até monitoramento de seus deslocamentos. O assédio atravessou a tela e invadiu sua vida cotidiana, afetando clientes que ainda a contratavam e pessoas próximas que se tornaram alvo de intimidação por demonstrar apoio.

Essa engrenagem mostrava a face mais sombria das redes. O perfil coletivo funcionava como central de mobilização e os seguidores, como pequeno exército que repetia ataques e pressionava novas vítimas a se pronunciar. Críticas legítimas sobre prazos ou acabamentos se diluíam em avalanche de humilhações públicas. Juliana, que antes buscava nas redes uma vitrine para o trabalho, passou a vê-las como campo de batalha onde sua imagem e dignidade eram atacadas diariamente.

No auge da perseguição, a estilista não era mais apenas uma profissional em disputa com parte da clientela. Tornara-se personagem descartável de um espetáculo de indignação. O bullying coletivo e o assédio constante revelavam como as redes sociais, em vez de mediar relações de consumo, se transformaram em palco de linchamentos que atravessam fronteiras legais e psicológicas.


O direito de se defender: a contra-narrativa em campo hostil


Se o perfil vítimas da estilista se estruturou como arquivo coletivo de acusações, Juliana buscou criar sua própria narrativa pública. A resposta veio meses depois, na forma de uma série de vídeos em que, capítulo por capítulo, ela analisava casos específicos, expunha prints, contratos, comprovantes de pagamento e reconstruía cada história a partir de sua perspectiva. O que para o perfil coletivo era prova de culpa, para ela se tornava oportunidade de explicação detalhada.

Os episódios mais comentados envolviam noivas que alegaram não ter recebido os vestidos conforme o combinado. Juliana reconstituiu linha do tempo, valores pagos, alterações de contrato e até mudanças de modelo pedidas de última hora. No caso da noiva que denunciou ter pago 50% de antecipação e desistido do vestido, a estilista mostrou mensagens em que a cliente cancelava o contrato, alegando motivos pessoais. Em outro episódio, rebateu a versão de que havia entregue um vestido inutilizável, afirmando que o modelo escolhido estava entre aqueles previamente aprovados pela cliente e apresentando provas do processo de criação. Em um desses vídeos Juliana revelou ter tentado o suicídio em virtude da onda de ataques digitais.

Esses vídeos funcionam como espécie de contra-inquérito, em que Juliana se colocava como narradora e investigadora de si mesma. Ao se sentar diante da câmera, ela se apresentava não apenas como estilista, mas como ré que assume o direito de defesa em um tribunal digital que lhe negava contraditório. Cada capítulo é construído como peça de argumentação, alternando indignação, provas documentais e apelos emocionais.

A estratégia, no entanto, acontece em campo hostil. O mesmo algoritmo que favorece o rage baiting contra ela não da a mesma visibilidade às suas respostas. Vídeos de acusação viralizavam em segundos, enquanto suas explicações têm alcance limitado, muitas vezes restrito às seguidoras mais fiéis. Além disso, suas falas são constantemente editadas e reutilizadas fora de contexto, servindo de novo combustível para o ciclo de humilhação.

Ainda assim, a série de vídeos teve importância simbólica. Representa a tentativa de retomar a voz diante de um massacre digital. Ao expor documentos e versões ignoradas, Juliana tentava mostrar que não era apenas alvo, mas sujeito de uma narrativa. Em muitos momentos, seu discurso se confunde com desabafo pessoal. Fala de noites sem dormir, crises de ansiedade, vergonha de sair na rua e a sensação de estar sendo perseguida até em ambientes privados.

O direito de se defender, nesse caso, não era garantido por uma instituição, mas pela persistência em gravar vídeos em série, respondendo um a um os casos que se acumulavam contra ela. A estilista transformou sua página em arena de resistência, onde cada prova apresentada funcionava menos como solução e mais como registro histórico de sua tentativa de sobrevivência.

Ao narrar o caso das noivas e tantos outros, Juliana mostrou que, em meio ao linchamento digital, a contra-narrativa é um exercício de dignidade. Mesmo dentro de um campo hostil, marcado por algoritmos que amplificam o ódio, ela escolheu afirmar sua versão, inscrevendo na memória coletiva ao menos uma marca de sua própria voz.


Capitalismo tardio e a monetização do linchamento


O caso de Juliana não pode ser compreendido apenas como conflito entre clientes e uma estilista. Ele também expõe um traço central do capitalismo tardio: a conversão da indignação em mercadoria. O linchamento virtual contra ela não se limitou ao perfil vítimas da estilista. Rapidamente, youtubers, influenciadores e criadores de conteúdo perceberam o potencial de audiência embutido em cada acusação e transformaram a polêmica em fonte de renda.

Reações em vídeo, cortes de lives e análises superficiais sobre cada denúncia passaram a circular como produto pronto para monetização. Para muitos desses criadores, pouco importava se os relatos tinham consistência ou se a estilista conseguia responder às acusações. O que interessava era a capacidade de atrair cliques, gerar engajamento e, consequentemente, aumentar receita publicitária. O ódio contra Juliana se converteu em espetáculo, um show permanente em que sua vida era usada como insumo para alimentar o ciclo de visualizações.

Essa engrenagem revela como a economia digital se sustenta da exploração da vulnerabilidade alheia. O rage baiting, que no início parecia apenas uma estratégia de perfis anônimos, mostrou-se parte de um ecossistema mais amplo. Ao transformar a estilista em personagem fixo de polêmicas, influenciadores consolidaram um modelo de negócio que combina indignação coletiva, algoritmos de recomendação e rentabilização do ódio. Juliana se tornou, contra sua vontade, matéria-prima de uma indústria simbólica que sobrevive da degradação pública.

A monetização do linchamento também dificultou qualquer tentativa de restauração da imagem da estilista. Cada resposta sua é imediatamente reinterpretada como novo conteúdo a ser explorado. O campo digital funciona como máquina de reciclar indignação, em que não há espaço para esquecimento nem para reparação. A lógica capitalista, movida pelo imperativo da atenção, assegurava que a polêmica nunca se encerrasse. A cada ciclo de viralização, novos criadores surgiam para disputar a audiência acumulada em torno do nome de Juliana, enquanto marcas e plataformas se beneficiavam do tráfego gerado por esse fluxo permanente de indignação. O resultado foi um ecossistema em que a dor virou insumo, a reputação virou moeda volátil e a justiça, reduzida a trending topics, perdeu densidade e método.


Reflexão final


O tribunal digital que se ergueu contra Juliana é sintoma de uma época em que as fronteiras entre responsabilização e castigo público se confundem. De um lado, a mobilização em torno das denúncias expressou frustrações reais de consumidoras que se sentiram lesadas e que, diante de instâncias de mediação frágeis, recorreram às redes como forma de reivindicar reparação. De outro, o processo ultrapassou rapidamente o terreno da crítica e adentrou a lógica do linchamento, alimentado por algoritmos que premiam o sensacional e por um mercado que transforma conflito em mercadoria.

A trajetória da estilista revela como as mesmas plataformas que concedem voz e visibilidade podem, em questão de dias, transformar pessoas em personagens descartáveis. Juliana, mulher com deficiência, marcada por cicatrizes desde a infância, buscou nas redes uma vitrine para o trabalho e encontrou um campo onde a vulnerabilidade se converte em capital de audiência. O caso evidencia uma pedagogia perversa da atenção, na qual o engajamento vale mais do que a apuração, e a indignação vale mais do que a mediação em que a própria defesa se faz com mais exposição.

O direito ao esquecimento, tão discutido no campo jurídico, esbarra no arquivo infinito do ambiente digital. Vídeos, comentários e cortes permanecem disponíveis e indexados, prontos para serem reativados sempre que houver oportunidade de ganho simbólico ou econômico. Apesar de sua série de respostas, cuidadosamente construída com documentos e cronologias, a estilista viu sua narrativa competir em desvantagem com um ecossistema inteiro que prospera com o prolongamento do conflito.

O caso também ilumina os limites da justiça pela plateia. A denúncia pública pode ser instrumento legítimo de proteção coletiva, mas, sem critérios e mediação, converte-se em dispositivo de humilhação, capaz de corroer vínculos sociais e apedrejar reputações de modo irreversível. Entre responsabilização e vingança digital existe uma linha tênue, e atravessá-la produz danos que não se reparam com retratações tardias ou com a simples remoção de conteúdos.

A história de Juliana expõe, por fim, uma contradição central do presente. A memória coletiva organizada por algoritmos promete transparência, porém naturaliza a violência simbólica. A participação cidadã promete controle social, porém ameaça dissolver o devido processo em catarse punitiva. Enquanto a indignação for convertida em produto e a dor em entretenimento, casos como o dela continuarão a servir de combustível para uma economia da atenção que prospera às custas da dignidade humana.

 
 
 

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