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A ideologia MAGA e o terrorismo institucional dos EUA

  • Foto do escritor: Rey Aragon
    Rey Aragon
  • há 28 minutos
  • 19 min de leitura

Os Estados Unidos se tornaram o maior promotor de terror do planeta. Sob a ideologia MAGA, o país institucionalizou o ódio, o armamentismo e a guerra cultural, transformando o medo em política de Estado e o terror em instrumento de poder global.


De Guantánamo à América Latina, da supremacia branca às sanções econômicas, o império que acusa o mundo de terrorismo é, na verdade, o epicentro do terror mundial — um Estado que exporta violência, impõe medo e chama isso de liberdade.

O espelho do terror



O mundo aprendeu a olhar o terrorismo com o mapa dos Estados Unidos.

Foi Washington quem inventou o léxico moderno do medo: eixo do mal, guerra ao terror, ameaça existencial, ataques preventivos.

Desde o 11 de setembro, a semântica americana molda a percepção global do perigo — e com ela o poder de decidir quem é humano, quem é inimigo e quem pode morrer em nome da segurança.

Mas, enquanto os Estados Unidos apontavam o dedo para o mundo, o espelho refletia a sua própria sombra.


O verdadeiro centro do terror não está nas montanhas do Afeganistão nem nos desertos do Iraque.

Ele está nas avenidas largas de Washington, nas torres de vidro do Pentágono e nas câmaras do Congresso que aplaudem orçamentos de guerra.

O terror contemporâneo é burocrático, institucional e legitimado pelo direito.

Não explode em cavernas, mas em decretos; não se esconde em túneis, mas em gabinetes climatizados.

E a ideologia MAGA — com seu culto ao medo, ao ódio e à pureza — é a forma mais explícita e visceral dessa mutação: o terror tornado moral doméstico, exportado como política de Estado.


Durante duas décadas, os Estados Unidos declararam guerra a fantasmas externos — terroristas, comunistas, migrantes, muçulmanos, socialistas, “woke”, ambientalistas.

Mas, dentro de suas fronteiras, a mesma retórica produziu outro tipo de jihad: armada de fuzis automáticos, justificada por uma teologia de supremacia branca e por uma paranoia racial que confunde democracia com ameaça.

O resultado é o império olhando para o mundo e vendo o reflexo de si mesmo — uma nação incapaz de distinguir segurança de dominação, fé de fanatismo, patriotismo de terror.


Desde o Patriot Act, o Estado americano vive num regime de exceção permanente.

A legalidade se tornou elástica, o conceito de ameaça se tornou infinito e a vigilância virou a religião civil de uma república cercada por seus próprios fantasmas.

O mesmo país que diz defender a liberdade construiu o mais sofisticado aparato de espionagem da história.

O mesmo governo que acusa outros de tortura mantém presos sem julgamento há décadas.

O mesmo império que se apresenta como farol da democracia patrocina golpes, bloqueios e assassinatos seletivos em nome de uma moral que já não ilumina nada — apenas queima.


Hoje, sob o ethos MAGA, o terror deixou de ser apenas uma política externa: tornou-se um modo de vida.

Nas ruas, ele veste bandeiras e carrega rifles.

Nas redes, ele se alimenta de desinformação e ódio performático.

Nas instituições, ele escreve decretos e sanciona leis que perseguem o diferente, o dissidente, o imigrante.

E nas fronteiras, ele volta a matar em nome da segurança, agora com outro nome — narcoterrorismo — para justificar o velho projeto imperial de sempre.


O terror que os Estados Unidos denunciam é, na verdade, o seu próprio reflexo — um espelho que o império insiste em quebrar para não enxergar a própria imagem.

A ideologia MAGA é o nome contemporâneo desse reflexo: o retorno do monstro ao lar, a fusão entre a violência doméstica e o expansionismo global.

E a partir dela, entender o século XXI não é mais uma questão de geopolítica, mas de psiquiatria coletiva — o estudo de uma nação que vive de fabricar inimigos para justificar a própria existência.

O império do medo — raízes do terrorismo institucional



O século XXI começou com um gesto de vingança.

O 11 de setembro não inaugurou o terrorismo — apenas lhe deu nova bandeira e uniforme.

O que nasceu naquele dia foi o Estado de exceção global: a ideia de que um país poderia suspender o direito internacional, invadir quem quisesse e eliminar qualquer pessoa que julgasse perigosa.

Sob o pretexto de combater o terror, os Estados Unidos inauguraram a era do terror legitimado.


George W. Bush não criou uma doutrina de segurança; criou uma religião política.

A palavra liberdade passou a significar obediência, e a palavra democracia tornou-se sinônimo de ocupação.

O Patriot Act, aprovado em 2001, dissolveu a fronteira entre segurança e vigilância.

Em nome da defesa, o Estado ganhou o direito de espionar, prender, torturar e matar — dentro e fora do território nacional.

O Congresso cedeu a ele a AUMF (Authorization for Use of Military Force), uma carta branca que transformou o planeta em campo de caça: qualquer suspeito, em qualquer lugar, poderia ser alvo.

A partir dali, o império descobriu que o medo é a moeda mais valiosa da política.


De Guantánamo a Abu Ghraib, a democracia americana aprendeu a justificar o indizível.

Os prisioneiros sem julgamento, os interrogatórios “reforçados”, os voos secretos da CIA, os drones que matavam famílias inteiras no Iêmen e no Paquistão — tudo isso foi normalizado pela retórica de autoproteção.

O terror, antes uma ameaça difusa, tornou-se uma técnica de governo.

O império descobriu que o medo controla mais do que as bombas.


Foi nesse caldo que germinou o terrorismo institucional — o uso sistemático da violência estatal para manter hegemonia e disciplina global.

Ele se expressa em leis, sanções, execuções extrajudiciais e na fabricação permanente de inimigos.

Cada vez que o sistema americano se sente ameaçado, ele reinventa um monstro: comunismo, Islã, narcotráfico, “woke”.

O inimigo é o espelho necessário que permite ao império reafirmar sua inocência.


No fundo, a chamada “guerra ao terror” nunca foi contra o terrorismo.

Foi contra qualquer forma de autonomia política que ousasse escapar da órbita de Washington.

Foi contra países que tentaram desenvolver ciência, petróleo ou soberania fora do dólar.

O terror foi apenas a linguagem moral que mascarou a velha disputa econômica.

Assim como Roma chamava de bárbaros os povos que não aceitavam seu domínio, os Estados Unidos chamam de terroristas todos aqueles que não aceitam a sua tutela.


O aparato montado após 2001 não foi desfeito — foi aperfeiçoado.

O Departamento de Segurança Interna (DHS), a Ofac, a Patriot Act, os tribunais secretos da Foreign Intelligence Surveillance Court e o poder executivo hipertrofiado se tornaram permanentes.

Cada presidente que veio depois — inclusive Barack Obama — apenas refinou o mecanismo.

Sob a retórica de moderação, o império automatizou o assassinato remoto e elevou o terror à condição de política pública.

Trump herdou essa estrutura e lhe deu uma alma: o ethos MAGA, a ideologia que legitima o ódio como virtude cívica e transforma a exceção em regra.


Foi assim que o império do medo se consolidou: um sistema onde o terror é a norma e a paz, a exceção.

Um país que acredita poder matar para se sentir seguro jamais conhecerá segurança.

E um Estado que precisa aterrorizar o mundo para afirmar sua liberdade já não é uma democracia — é uma teocracia do medo, regida pela fé na própria impunidade.

O laboratório interno — MAGA e o terror doméstico



O terror, um dia projetado sobre o mundo, encontrou morada dentro dos Estados Unidos.

A mesma nação que dizia libertar povos oprimidos começou a oprimir os seus.

Foi o retorno da violência imperial à metrópole: a lógica de guerra aplicada ao cotidiano, a retórica de cruzada transformada em cultura política.

Nasceu daí a ideologia MAGA — a sigla que resumia um desejo e escondia um pesadelo: Make America Great Again.

O que se vendia como patriotismo era, na verdade, a nostalgia de uma supremacia perdida.


O MAGA não é apenas um movimento político; é uma psicologia coletiva.

Nasce do medo do declínio, da culpa reprimida da escravidão, da perda simbólica do poder branco e masculino.

É a tentativa de restaurar um passado mítico — uma América pura, cristã, heteronormativa e homogênea — que jamais existiu fora da imaginação de seus adoradores.

Para isso, foi necessário eleger um inimigo interno.

Se a guerra ao terror precisava de terroristas árabes, o MAGA precisava de imigrantes, negros, latinos, muçulmanos, feministas e progressistas.

A violência se deslocou das fronteiras geográficas para as fronteiras culturais.


Sob Donald Trump, o Estado aprendeu a falar a língua da milícia.

O slogan law and order tornou-se código para repressão.

O build the wall deixou de ser política migratória e virou símbolo de pureza racial.

A promessa de “retomar o país” era um eufemismo para restaurar hierarquias antigas.

E a Segunda Emenda, interpretada como direito sagrado, converteu o armamento civil em sacramento.

Nos comícios, nos fóruns da internet, nas igrejas e nas universidades capturadas, a arma tornou-se o batismo do cidadão MAGA — a fusão perfeita entre fé, medo e identidade.


A cultura do rifle é o novo evangelho americano.

Os fuzis AR-15 são exibidos como talismãs, símbolos de liberdade e virilidade.

Mas, na prática, eles se tornaram a materialização do pavor: o medo do outro, do Estado, da diferença.

Cada tiroteio em escola, cada massacre racial, é o eco de uma ideologia que transformou a paranoia em virtude.

Quando um jovem branco entra armado num supermercado ou numa igreja, ele não está “enlouquecido”: está encenando o papel que o país lhe ensinou.

É o soldado solitário de uma guerra sem fronteiras, travada contra a ideia de diversidade.


Enquanto isso, a violência institucional se sofisticou.

O DHS e o ICE herdaram os métodos da guerra ao terror e os aplicaram a migrantes e refugiados.

A máquina administrativa de Trump produziu uma burocracia do ódio: deportações em massa, separações de famílias, campos de detenção e execuções sumárias na fronteira.

A retórica da segurança nacional justificava tudo.

E a indiferença moral foi o cimento dessa arquitetura.

A mesma nação que se horrorizou com o ISIS manteve crianças presas em jaulas, sob holofotes de LED e bandeiras tremulando ao fundo.


Mas o terror MAGA não é apenas físico; é simbólico, psicológico, informacional.

A guerra cultural que Trump institucionalizou é uma guerra de narrativas.

Os inimigos são difusos — feministas, ambientalistas, professores, jornalistas, artistas, cientistas.

As armas são memes, desinformação, cancelamentos digitais e perseguições judiciais.

As trincheiras estão nas redes sociais, nos tribunais e nas igrejas eletrônicas que substituíram a fé pelo ressentimento.

A fronteira do terror passou a ser a mente — o território mais valioso da contemporaneidade.


O 6 de janeiro de 2021 foi o ponto de fusão entre todos esses elementos.

Ali, o terrorismo político assumiu forma explícita: uma turba branca, armada, envolta em bandeiras e bênçãos religiosas, invadindo o coração da democracia americana.

Não era apenas um ataque ao Capitólio; era a consagração pública do terror como linguagem política.

A violência tornou-se performática, litúrgica, catequética.

O MAGA provou que a guerra cultural podia se converter em guerra real — e que o império, finalmente, havia exportado para dentro de si a sua própria brutalidade.


Hoje, os Estados Unidos vivem em estado de cerco permanente.

Um país dividido por tribos, isolado por muros e armado até os dentes.

A mesma lógica que devastou o Iraque agora devora suas próprias cidades.

A paranoia coletiva se alimenta da sensação de declínio, e o ódio virou o último vínculo social.

O terror, que antes era instrumento de hegemonia, tornou-se cimento de coesão nacional.

E o MAGA é a sua bandeira: a estética de uma civilização em colapso, vestida de patriotismo e banhada em sangue.

A engrenagem jurídica da perseguição



O terror moderno não precisa mais se esconder nas sombras — ele agora carrega crachá, emite memorandos e publica decretos no Federal Register.

Nos Estados Unidos, a perseguição deixou de ser marginal e tornou-se institucional.

O que antes era o discurso de grupos extremistas foi gradualmente incorporado ao léxico da burocracia, traduzido em políticas, regulamentos e sentenças.

A violência virou ofício, a intolerância virou jurisprudência e a lei, que deveria proteger, passou a punir o dissenso.

É o triunfo silencioso daquilo que Walter Benjamin chamou de “estado de exceção tornado regra”.


Sob Donald Trump, o direito deixou de ser o limite do poder e passou a ser o seu instrumento.

O governo descobriu que não precisava mais de golpes, apenas de advogados.

As agências federais foram transformadas em armas administrativas.

O Departamento de Segurança Interna (DHS), o Departamento de Justiça (DOJ), o Serviço de Imigração e Alfândega (ICE) e o Departamento de Educação (DOE) foram instrumentalizados como exércitos civis na guerra cultural contra minorias e opositores políticos.

Cada nova regra era uma bala assinada por um burocrata.


No campo migratório, o terror ganhou forma jurídica.

A política de “tolerância zero” criminalizou o simples ato de cruzar a fronteira, gerando milhares de separações familiares.

Crianças foram arrancadas dos pais e mantidas em centros de detenção — o eufemismo técnico para jaulas.

A “Remain in Mexico” forçou solicitantes de asilo a esperar em território estrangeiro, expostos à violência de milícias e ao desespero.

O Title 42, travestido de medida sanitária, transformou a saúde pública em arma de exclusão.

E a lógica do “public charge” punia pobres e doentes por precisarem de assistência — a negação absoluta do ideal de dignidade.

Tudo com assinatura oficial, carimbo e número de protocolo.

O terror burocrático é o mais eficiente porque é o mais frio.


No campo dos direitos civis, a estratégia foi semelhante.

A ideologia MAGA infiltrou-se na gramática da moral e nas brechas do direito.

O HHS reescreveu as normas da Seção 1557 do Affordable Care Act, removendo proteções contra discriminação de gênero.

O Departamento de Educação revogou as diretrizes de inclusão de estudantes trans sob o Title IX.

O Pentágono vetou pessoas trans nas Forças Armadas.

O EEOC foi aparelhado para reinterpretar discriminação como “liberdade religiosa”.

E a Ordem Executiva 13950 proibiu treinamentos de diversidade, censurando a palavra “racismo sistêmico” nas repartições públicas.

O terror não mais gritava — ele agora redigia pareceres.


No campo informacional, a engrenagem jurídica foi ainda mais sofisticada.

Enquanto o DHS perseguia jornalistas sob o pretexto de segurança nacional, o Departamento de Justiça tentava classificar o movimento ANTIFA como organização terrorista, apesar de inexistir base legal para designar grupos domésticos dessa forma.

Era o lawfare elevado à condição de política pública: a criminalização do pensamento crítico.

A Constituição americana, concebida para limitar o poder, tornava-se o papel em que o poder assinava a própria exceção.


A cultura MAGA se alimenta desse fetiche legal.

Cada decisão judicial contra direitos humanos é celebrada como vitória moral.

Cada decreto que reduz proteções é tratado como restauração da “ordem natural”.

Cada ataque à diversidade é vendido como defesa da liberdade.

O ódio ganha respeitabilidade quando veste terno e fala em nome da lei.

O terror jurídico é o mais perigoso porque não se reconhece como terror — ele se vê como justiça.


Ao longo de quatro anos — e, agora, em seu retorno ao poder em 2025 — Trump demonstrou que o autoritarismo do século XXI não precisa fechar parlamentos nem queimar constituições.

Basta reinterpretá-las.

Basta dobrar o direito até que ele se curve ao medo.

Assim, o MAGA não destruiu as instituições: colonizou-as.

Transformou ministérios em tribunais morais, cortes em trincheiras ideológicas e a lei em instrumento de exclusão.

Tudo dentro da legalidade — uma legalidade podre, mas ainda legal.


É assim que nasce o terror institucional: não da ausência de lei, mas do seu uso como arma.

Quando a norma serve ao ódio, a justiça se torna uma farsa.

E os Estados Unidos, outrora símbolo da “liberdade”, tornaram-se o laboratório do autoritarismo democrático — o país onde o terror é constitucional.

A exportação do terror — da guerra ao terror ao narcoterrorismo



O poder que os Estados Unidos aprenderam a exercer arrasta-se hoje para além de suas fronteiras — não como diplomacia, mas como ocupação. Sob o novo rótulo de “narcoterrorismo”, Washington transformou o combate às drogas em pretexto para intervir militarmente, impor sanções econômicas e redefinir a soberania alheia. A máscara mudou; o método é o mesmo: o terror como ferramenta de dominação.


Em 2025, o governo Trump reinstalou a doutrina Bush, adaptando-a ao cenário hemisférico. Cartéis latino-americanos foram rotulados como organizações terroristas, e a designação abriu as portas para o bloqueio de ativos, a suspensão de cooperação diplomática e o uso unilateral da força. Navios de guerra cruzaram o Caribe e drones sobrevoaram o Pacífico Leste sob a justificativa de “neutralizar ameaças terroristas”. A retórica do medo atravessou as ondas do rádio e as fronteiras marítimas.

O resultado foi previsível: mortes, tensões e a erosão silenciosa do direito internacional.


O mecanismo jurídico é sempre o mesmo.

Basta rotular o inimigo.

Ao transformar um cartel, um governo ou um movimento social em “entidade terrorista”, o Estado americano ganha carta branca para sancionar, intervir ou assassinar em qualquer parte do planeta.

A International Emergency Economic Powers Act, o Foreign Terrorist Organization Act e o Kingpin Act são as escrituras desse poder: decretos que permitem à Casa Branca impor punições unilaterais sob o disfarce da legalidade.

É o império agindo com toga e uniforme, juiz e executor da própria moral.


Na América Latina, essa doutrina ganhou corpo sob o pretexto de combater o narcotráfico.

O “terror” migrou das montanhas do Afeganistão para as selvas da Colômbia, os portos do Caribe e as fronteiras do México.

Mas, por trás da narrativa, o que se expande é o controle estratégico sobre rotas comerciais, recursos naturais e políticas de segurança.

Os Estados Unidos voltam a agir como o xerife do hemisfério, aplicando castigos exemplares e intervindo em políticas internas sob o pretexto da lei.

A guerra às drogas converteu-se em guerra aos povos.


Os governos latino-americanos sabem que essa “cooperação” vem acompanhada de chantagem.

Quem não aceita o alinhamento sofre sanções; quem resiste, é acusado de cumplicidade com o terror.

A máquina de Washington fabrica moralidade conforme a conveniência geopolítica: ora o aliado corrupto é “estrategicamente importante”, ora o país soberano é “ameaça regional”.

A definição de terrorismo é elástica — e, como todo império, os Estados Unidos só reconhecem o direito quando o direito lhes serve.


Essa nova doutrina tem um nome e uma alma: MAGA.

É a ideologia que reatualiza o destino manifesto, combinando excepcionalismo, racismo e messianismo.

É a crença de que a América é moralmente autorizada a punir o mundo porque se julga escolhida por Deus.

Cada intervenção é uma cruzada.

Cada sanção, um sermão.

Cada ataque, uma catequese.

O império já não precisa justificar seus crimes — basta declará-los como defesa da civilização.


O que os Estados Unidos chamam de “narcoterrorismo” é apenas o nome mais recente de uma longa tradição: a do terror institucionalizado em escala global.

O mesmo país que acusa o mundo de terrorismo é o que mais pratica assassinatos seletivos, destrói governos, financia golpes e arruína economias inteiras.

O verdadeiro terrorismo é o da diplomacia coercitiva, do lawfare transnacional, das bases militares que circundam o planeta como grilhões.

E por trás dessa engrenagem, a ideologia MAGA fornece o combustível emocional — a paranoia racial, a crença no inimigo e a convicção de que a violência é virtude patriótica.


Assim, o terror deixou de ser apenas uma exportação militar.

Tornou-se a principal commodity da política americana.

O império do medo vende segurança, distribui sanções e colhe submissão.

E o hemisfério sul, mais uma vez, é o laboratório onde os Estados Unidos testam sua doutrina do pavor — uma teologia armada que continua chamando destruição de liberdade e guerra de paz.

O duplo padrão moral — quem define o terror?



No século XXI, o verdadeiro campo de batalha não é o território, mas a linguagem.

Os Estados Unidos compreenderam que dominar o mundo é dominar as palavras.

Controlar o significado de democracia, liberdade, terrorismo ou ameaça é controlar a narrativa da civilização.

E quem controla a narrativa controla o inimigo.

O império americano venceu não apenas pela força das armas, mas pela força das definições.


Quando Washington chama alguém de “terrorista”, essa palavra não descreve um crime; ela cria um inimigo.

É uma sentença prévia, uma morte simbólica antes da física.

Nenhum tribunal internacional revisa, nenhuma instância apela, nenhuma ONU intervém.

A acusação é em si a condenação.

Ser “terrorista” significa estar fora da humanidade — e, portanto, fora do direito.

Assim o império se autoriza a matar, sancionar, silenciar.

E, ao fazê-lo, veste a toga do juiz e a farda do executor ao mesmo tempo.


O duplo padrão é o alicerce invisível dessa lógica.

Quando um míssil americano destrói uma aldeia no Iêmen, é “autodefesa”.

Quando um adolescente palestino arremessa uma pedra, é “terrorismo”.

Quando manifestantes nos Estados Unidos invadem o Capitólio, é “protesto político”.

Mas quando cidadãos de outros países enfrentam regimes apoiados por Washington, é “insurgência criminosa”.

O império define não só o que é violência, mas quem tem o direito de exercê-la.

Esse é o privilégio supremo do poder: a prerrogativa moral da contradição.


O mesmo raciocínio vale para a América Latina.

Quando um governo eleito resiste à imposição de sanções ou busca autonomia energética, é “populista autoritário”.

Quando obedece às ordens de Washington, é “parceiro confiável”.

A moral americana é um espelho de duas faces: reflete virtude quando olha para si, e projeta barbárie quando olha para o sul.

É um código ético feito para nunca se aplicar ao autor.

E o mais cruel é que boa parte do mundo ainda acredita nessa simulação.


O controle da linguagem é também o controle da percepção.

As grandes corporações midiáticas — CNN, Fox, Bloomberg, The Washington Post — são braços narrativos do poder estatal.

Transformam bombardeios em “operações de precisão”, sanções em “medidas diplomáticas”, golpes de Estado em “transições democráticas”.

É a pedagogia do medo ensinando o mundo a agradecer pelas suas próprias feridas.

Enquanto o império impõe a dor, a mídia traduz essa dor em moralidade.


A ideologia MAGA radicalizou essa tradição.

Se antes o império precisava justificar suas guerras com relatórios e comitês, agora basta um tweet ou um sermão religioso.

O discurso de Trump simplificou o dogma: existem os bons (americanos) e os maus (todo o resto).

O raciocínio maniqueísta que legitimava o bombardeio de Bagdá é o mesmo que hoje legitima a perseguição a imigrantes, negros, ambientalistas e jornalistas dentro dos Estados Unidos.

A fronteira entre política externa e interna desapareceu.

O mesmo medo que alimenta o Pentágono alimenta as milícias civis.

O mesmo ódio que justifica sanções justifica tiroteios em escolas.


O resultado é um país que vive de acusar os outros de crimes que ele mesmo comete.

Um Estado que se apresenta como guardião da civilização enquanto destrói o tecido civilizatório do planeta.

Um governo que fala em “liberdade de imprensa” enquanto persegue jornalistas, que defende “democracia” enquanto financia golpes, e que diz “lutar contra o terror” enquanto institucionaliza o medo.

Os Estados Unidos não combatem o terrorismo; eles administram o terror — interna e externamente — como quem gere um negócio lucrativo.


O verdadeiro poder americano não está nas armas, mas nas palavras.

E é por isso que o combate ao império do medo não é apenas militar ou diplomático — é semântico.

É preciso reconquistar o direito de nomear o mundo.

Porque enquanto os Estados Unidos forem os donos do dicionário, continuarão sendo os donos do destino alheio.

A geopolítica do medo — o império em crise



O império norte-americano sempre se alimentou da ideia de que o medo é um princípio de ordem.

Quando a economia declina, cria-se um inimigo.

Quando a política se divide, fabrica-se uma ameaça.

Quando o prestígio internacional se dissolve, reativa-se a retórica da salvação.

O medo é o cimento de uma nação que perdeu a fé em si mesma, mas ainda acredita que pode comandar o mundo pela intimidação.


A geopolítica americana de 2025 é, portanto, uma política de pânico.

O país que durante décadas se apresentava como arquiteto da “ordem liberal internacional” agora age como um império sitiado.

As guerras fracassadas, a estagnação econômica, o declínio industrial, a ascensão da China e o avanço dos BRICS minaram o mito da invulnerabilidade.

E o trumpismo, longe de romper com esse mito, o transformou em religião de sobrevivência.

A doutrina MAGA é o último suspiro de um império que só sabe existir enquanto inimigo de alguém.


A volta de Trump à Casa Branca não representa uma ruptura, mas uma radicalização.

Se o primeiro mandato normalizou o autoritarismo, o segundo o institucionalizou.

O Departamento de Estado opera como um braço do ressentimento.

O Congresso é pautado por batalhas simbólicas — aborto, imigração, livros, vacinas, religião — enquanto o país perde influência em todos os continentes.

A diplomacia foi substituída por chantagem.

A política externa virou extensão da guerra cultural doméstica.

E o que antes era “guerra ao terror” virou “guerra à dissidência”.


No plano internacional, a obsessão com o controle se traduz em sanções, lawfare e vigilância digital.

Empresas de tecnologia, fundos de investimento e agências de segurança formam o novo tripé do poder coercitivo americano.

A economia da vigilância é a continuidade do complexo industrial-militar por outros meios.

O dólar e o dado são as duas faces da mesma moeda.

Cada bloqueio financeiro, cada ataque informacional, cada campanha de desestabilização é parte de um mesmo arsenal — menos ruidoso, mas tão letal quanto os bombardeios de outrora.


Enquanto isso, no sul global, o império tenta conter o inevitável: o surgimento de uma nova ordem multipolar.

Os BRICS expandem-se, a China consolida rotas comerciais transcontinentais, a Rússia resiste à asfixia econômica e a América Latina começa a articular projetos de integração soberana.

Diante disso, os Estados Unidos reagem como todo império em declínio: substituem a diplomacia pela coerção e a legitimidade pelo medo.

É a estratégia do escorpião — ferir mesmo quando o veneno já não garante a vitória.


Mas há algo de novo nesse colapso: o terror que antes era arma agora é sintoma.

O império do medo vive em estado de ansiedade permanente, incapaz de distinguir defesa de agressão.

Sua máquina de guerra tornou-se refém da própria retórica.

Cada vez que o mundo tenta respirar fora de sua órbita, Washington sente vertigem.

E quanto mais o império teme o fim, mais precisa justificar-se como salvador.


O paradoxo é absoluto: para se manter vivo, o império precisa destruir a confiança global que o sustentava.

O soft power americano — sua cultura, seu cinema, sua ciência — está contaminado pela vulgaridade da guerra cultural e pela paranoia interna.

O trumpismo, ao transformar a violência em identidade, matou o encanto moral dos Estados Unidos.

Hoje o país exporta armas, fake news e sanções, mas já não exporta esperança.

A América que prometia liberdade tornou-se o principal vetor mundial do medo.


O século XXI está presenciando o momento em que o império se torna o próprio inimigo.

O medo que Washington projetou sobre o mundo volta agora como reflexo.

A ideologia MAGA, com sua retórica messiânica e seu fanatismo identitário, é o retrato psicológico desse colapso.

O império, incapaz de aceitar a pluralidade, reage como um organismo doente: isolando-se, inflamando-se, atacando-se.

E o terror, que antes era uma ferramenta de controle, tornou-se o sintoma final de sua decadência.

O século do contragolpe



Todo império nasce prometendo segurança e termina implorando por obediência.

Os Estados Unidos não são exceção — são apenas o exemplo mais sofisticado desse ciclo.

Durante um século, venderam ao mundo a ideia de liberdade como se fosse um produto, e o mundo, seduzido pela publicidade do poder, comprou a ilusão.

Mas o império que dizia proteger a democracia transformou-se no seu maior algoz.

A ideologia MAGA é apenas o espelho mais nítido dessa falência: o momento em que a nação que mais falou de liberdade aprendeu a viver do medo.


O terror americano é um espelho quebrado.

Cada estilhaço reflete uma guerra, uma intervenção, um massacre, uma sanção.

Juntos, eles formam o retrato de um país que não consegue mais sustentar o mito de sua inocência.

O mundo olha para Washington e já não vê um farol — vê um arsenal.

A bandeira que tremulava como símbolo de esperança agora tremula como advertência.

E o que o império chama de “ordem” o planeta reconhece como coerção.


Mas há algo que o poder americano ainda não compreendeu: o medo é contagioso, mas também finito.

Nenhum império pode governar para sempre pela força do terror.

A violência, quando se torna método, acaba voltando-se contra quem a pratica.

E é justamente nesse refluxo que o mundo começa a mudar.

A América Latina, a África, a Ásia e o Oriente Médio já aprenderam que resistir não é crime — é instinto de sobrevivência.

O contragolpe do século XXI não é armado, é civilizatório.

Nasce das universidades públicas, dos povos originários, das mulheres, dos jovens, dos movimentos que insistem em dizer “não” ao império da obediência.


O século do contragolpe será o século em que o mundo retomará o direito de nomear a si mesmo.

O direito de decidir o que é liberdade, o que é justiça e o que é terrorismo — sem precisar da tradução de Washington.

Será o século em que a soberania voltará a ser o idioma da dignidade.

E quando o império perceber que já não assusta, seu poder se dissolverá como fumaça.

Porque um império sem medo para vender é apenas um país cansado de si mesmo.


A verdadeira luta contra o terror não é militar — é ética.

Não é feita com armas, mas com memória.

É o esforço coletivo de reconstruir a confiança, o diálogo e a justiça entre povos.

É compreender que o terror americano, embora poderoso, é apenas uma das faces da crise de uma civilização que perdeu o sentido do humano.

Resistir a ele é relembrar que a humanidade não é uma doutrina, é uma promessa.


O império do medo chegará ao fim quando o mundo aprender a duvidar das suas palavras e a desobedecer aos seus mitos.

E esse dia está mais próximo do que imagina.

Porque toda tirania tem um limite, e todo império, um ocaso.

Mas a coragem — essa sim — é infinita.

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