A ordem executiva dos EUA que libera espionagem e golpes
- Rey Aragon

- 6 de set.
- 13 min de leitura

Sob o pretexto de “detenção indevida”, Washington aciona sanções, controle de exportações e vetos de visto para intimidar Estados soberanos — e blindar seus operadores, oficiais e extraoficiais, na América Latina e no Brasil.
Em 2025, uma canetada transformou um pretexto humanitário em arma estratégica: se um país tocar em um cidadão norte-americano, paga a conta. O que se vende como “proteção” vira licença para coerção — sanções, estrangulamento tecnológico, veto de vistos e campanhas de deslegitimação. Na prática, abre-se a porta para agitação, espionagem e operações de desestabilização contra democracias que não se alinham — com foco imediato na América Latina e no Brasil.
A canetada que mudou as regras

Em setembro de 2025, Donald Trump assinou uma ordem executiva aparentemente técnica, mas com implicações sísmicas para a geopolítica mundial. Batizada de “State Sponsors of Wrongful Detention”, a medida autoriza o governo dos Estados Unidos a classificar qualquer país que detenha um cidadão americano como “Estado patrocinador de detenção indevida”. A partir dessa designação, Washington pode acionar um arsenal de sanções financeiras, controles de exportação, restrições de visto e isolamento diplomático — tudo em nome da “proteção” de seus nacionais.
O que soa como gesto humanitário é, na prática, a transformação de um princípio jurídico interno em arma de coerção global. Ao criar esse dispositivo, os EUA não apenas reforçam sua capacidade de punir adversários: eles erguem um escudo político-jurídico que protege seus agentes — oficiais e extraoficiais — espalhados pelo mundo. De diplomatas a contratados privados, de lobistas a operadores de desinformação, qualquer cidadão norte-americano que atue em operações de influência em países soberanos passa a contar com a ameaça permanente de retaliação caso seja responsabilizado localmente.
Esse movimento é decisivo porque muda as regras do jogo. Até aqui, os EUA já operavam como potência que extrapola seus limites territoriais: invocavam leis como a IEEPA para sancionar empresas chinesas, aplicavam o Patriot Act em transações internacionais, impunham embargos unilaterais a países do Sul Global. Mas com a nova EO, a lógica vai além: qualquer ato soberano de um Estado — prisão, investigação, responsabilização judicial — pode ser enquadrado como agressão aos EUA. Em outras palavras, uma decisão de um juiz brasileiro, venezuelano ou colombiano pode desencadear sanções automáticas vindas de Washington.
Na essência, a mensagem é clara: a partir de agora, os EUA se reservam o direito de intervir em qualquer lugar, em qualquer circunstância, sempre que seus cidadãos forem alvo de ações legítimas de outro Estado. É a consagração, por decreto, de uma doutrina de poder sem fronteiras. E, ao mesmo tempo, é um aviso às democracias latino-americanas: a soberania de vocês tem limites definidos em Washington.
O novo arsenal jurídico de Washington

A nova ordem executiva de Trump não surge do nada. Ela se ancora em um conjunto robusto de legislações norte-americanas que, ao longo das últimas décadas, foram desenhadas para permitir ao presidente agir unilateralmente em nome da “segurança nacional”. Essas leis, escritas para responder a emergências internas, acabaram se transformando em instrumentos de política externa, aplicados contra qualquer país que desafie os interesses de Washington.
A peça central é a International Emergency Economic Powers Act (IEEPA), de 1977. Esse dispositivo autoriza o presidente, ao declarar uma emergência nacional, a bloquear bens, congelar contas, proibir transações e impor sanções com alcance extraterritorial. Como o sistema financeiro mundial gira em torno do dólar, basta uma canetada para que bancos, empresas e governos estrangeiros se vejam obrigados a obedecer às ordens da Casa Branca, sob pena de exclusão do sistema internacional de pagamentos.
A IEEPA se articula com a National Emergencies Act (NEA), que permite ao presidente decretar estados de emergência de forma ampla e renovável quase indefinidamente. Foi exatamente essa engrenagem que Trump acionou para justificar tarifas e restrições comerciais contra o Brasil em 2025, enquadrando o país como ameaça à segurança nacional dos EUA.
Outro dispositivo fundamental é o 8 U.S.C. §1182(f), que concede ao presidente poder discricionário para suspender a entrada de estrangeiros nos Estados Unidos. Em termos práticos, isso significa que ministros, juízes, empresários ou qualquer autoridade de um país designado como “patrocinador de detenção indevida” podem, da noite para o dia, ser proibidos de pisar em território americano. A medida tem um impacto simbólico imediato: converte lideranças legítimas em “párias internacionais”, alimentando a narrativa de que o país em questão é uma ameaça à democracia e aos direitos humanos.
Por fim, embora a ordem executiva não autorize explicitamente golpes de Estado ou espionagem, ela dialoga com o arcabouço de covert action regulado pelo 50 U.S.C. §3093, que disciplina operações secretas da CIA e exige apenas uma notificação ao Congresso. A linha que separa coerção econômica e ação encoberta é tênue: na prática, a nova EO funciona como um selo jurídico que abre espaço para medidas paralelas — de sabotagens informacionais a pressões diplomáticas e, em casos extremos, operações clandestinas.
O resultado é um arsenal jurídico que dá aos EUA a capacidade de agir sem pedir permissão a ninguém. O que começa como decreto doméstico termina, inevitavelmente, como política global. E o alvo preferencial são os países que ousam agir de forma soberana no Sul Global — com destaque para a América Latina.
Do direito internacional à prática da coerção

Se na esfera doméstica a ordem executiva de Trump repousa sobre bases legais sólidas — IEEPA, NEA, §1182(f) — no plano internacional ela se assenta em terreno frágil. A razão é simples: o direito internacional proíbe expressamente a ameaça ou o uso da força nas relações entre Estados, e condena qualquer forma de coerção econômica ou política que interfira na soberania alheia.
A Carta das Nações Unidas, em seu artigo 2(4), é cristalina: todos os membros devem se abster de “recorrer à ameaça ou ao uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado”. Embora durante décadas se tenha debatido se sanções unilaterais se enquadram nesse dispositivo, a prática e a doutrina majoritária convergem para um ponto: quando a coerção econômica visa alterar decisões internas de um governo soberano, estamos diante de uma violação do espírito, senão da letra, da Carta.
A Resolução 2625 da Assembleia Geral da ONU, de 1970, reforça essa interpretação. O texto consagra a Declaração sobre Princípios de Direito Internacional Relativos às Relações Amistosas e Cooperação entre os Estados, condenando de forma explícita o uso de “medidas de coerção econômica, política ou de qualquer outra natureza” para subordinar um Estado à vontade de outro. É exatamente o que a nova ordem executiva permite aos EUA: transformar uma prisão legítima — decidida por um juiz em Brasília, Caracas ou Bogotá — em pretexto para impor sanções, vetos de visto e bloqueios econômicos.
No plano interamericano, a Carta da OEA vai além. Seu artigo 19 veda qualquer forma de intervenção, “direta ou indireta, e seja qual for o motivo”, nos assuntos internos de outro Estado. Ao institucionalizar uma política de sanções automáticas contra países que detenham cidadãos norte-americanos, Washington afronta de maneira direta os compromissos que assumiu no sistema regional ao qual pertence.
Essa contradição entre a legalidade interna e a ilegitimidade internacional não é novidade. Embargos contra Cuba, sanções contra a Venezuela e o Irã, bloqueios contra empresas chinesas: todos seguem a mesma lógica. O que a ordem executiva de 2025 faz é expandir o escopo, transformando em alvo não apenas governos que desafiam abertamente os EUA, mas qualquer Estado que ouse responsabilizar juridicamente um cidadão norte-americano.
Na prática, o direito internacional é atropelado pela assimetria de poder. Não existe tribunal global capaz de obrigar Washington a recuar. O que se impõe é a lei do dólar e da força: uma ordem executiva assinada em Washington tem mais efeito que uma resolução da ONU em Nova York. E é essa assimetria que coloca democracias como a brasileira em uma posição delicada: exercer a soberania pode significar abrir a porta para retaliações devastadoras.
O laboratório latino-americano

A América Latina sempre foi o campo de ensaio preferencial da política externa norte-americana. Da Doutrina Monroe ao golpe de 1964 no Brasil, passando pela Operação Condor e pelo bloqueio a Cuba, cada geração de presidentes em Washington utilizou o continente como laboratório de intervenções — diplomáticas, militares, econômicas e, mais recentemente, informacionais. A nova ordem executiva de Trump, que transforma qualquer prisão de um cidadão americano em “detenção indevida”, se inscreve nessa longa tradição.
O Brasil ocupa o centro desse tabuleiro. Em 2025, o país foi atingido por uma tarifa de 50% sobre exportações estratégicas, sob a justificativa de “emergência nacional” nos EUA. Pouco depois, o ministro Alexandre de Moraes foi sancionado pessoalmente pelo Tesouro americano, num gesto inédito de agressão institucional contra um membro do Supremo Tribunal Federal. A mensagem era inequívoca: quem ousar liderar o processo de regulação das plataformas digitais, ou investigar redes articuladas com interesses norte-americanos, será transformado em inimigo global.
A Venezuela segue como alvo histórico. Qualquer prisão de contratados privados ou operadores políticos vinculados a Washington pode ser automaticamente enquadrada como “wrongful detention”. A lógica é clara: blindar a ação dos agentes extraoficiais que operam em solo venezuelano, seja no campo da informação, da economia paralela ou do tráfico de influência. O mesmo se aplica à Colômbia, onde a presença de DEA, FBI e contratados militares privados faz da fronteira amazônica e caribenha um espaço de disputa permanente.
O Mar do Caribe também aparece como zona crítica. Países como Cuba, Nicarágua e até ilhas menores que busquem estreitar relações com China ou Rússia podem ser enquadrados sem dificuldade. A nova EO funciona como uma espada suspensa sobre qualquer Estado que decida agir com autonomia, sobretudo na segurança regional e na política digital.
O ponto de convergência é a noção de soberania condicionada: governos latino-americanos são forçados a calcular não apenas os efeitos internos de suas decisões, mas o risco de desencadear retaliações de Washington. Na prática, isso mina a independência das instituições judiciais e fragiliza a capacidade de ação soberana. O juiz que pensa em prender um operador estrangeiro, o ministro que defende a regulação de plataformas, o governo que assina um acordo tecnológico fora da órbita americana — todos passam a atuar sob a sombra da ameaça de sanções.
É esse ambiente de intimidação sistêmica que transforma a América Latina em verdadeiro laboratório da guerra híbrida contemporânea. O que se testa aqui — lawfare transnacional, sanções seletivas, campanhas de desinformação, manipulação de elites — será exportado depois para outras regiões em disputa.
O elo entre retórica interna e ameaça externa

A engrenagem de desestabilização não funciona isolada. Ela depende de uma sincronia entre o discurso doméstico da extrema-direita brasileira e a retórica oficial de Washington. O resultado é um efeito pinça: enquanto lideranças locais minam a legitimidade das instituições, figuras do establishment norte-americano acenam com sanções e retaliações.
A provocação de Paulo Figueiredo foi emblemática: “Só quero que o Alexandre agora prenda um cidadão americano e me faça mais feliz”. Não se trata de uma piada, mas de uma armadilha discursiva. Se o Judiciário brasileiro tomar qualquer medida contra cidadãos norte-americanos envolvidos em operações de lobby, desinformação ou espionagem, Washington poderá enquadrar o ato como “detenção indevida” e acionar a ordem executiva.
Horas depois, o Secretário de Estado Marco Rubio reforçou a ameaça em rede social: “Se você tentar usar um americano como moeda de troca, enfrentará severas consequências”. A mensagem é clara: qualquer prisão legítima, decidida soberanamente por tribunais nacionais, pode ser convertida em gatilho para sanções econômicas e isolamento diplomático.
O ataque de Eduardo Bolsonaro, acusando sem provas o ministro Alexandre de Moraes de ser “bilionário”, fecha o circuito. A estratégia é corroer a imagem da autoridade que lidera a regulação das plataformas digitais, enquanto se prepara terreno para deslegitimar suas decisões. A combinação é fatal: dentro, acusações de corrupção; fora, ameaça de retaliação internacional.
Essa triangulação — Figueiredo, Rubio, Bolsonaro — é o retrato da guerra híbrida em tempo real. O objetivo não é apenas intimidar um ministro ou um tribunal. É criar um ambiente de medo e de autocensura, onde cada juiz, cada promotor, cada autoridade brasileira pensa duas vezes antes de tocar em redes vinculadas aos Estados Unidos. Assim, o direito soberano se converte em risco calculado de retaliação.
Soft power contra hard power

Donald Trump entende de força. Tarifas, sanções, ameaças militares, restrições de visto: esse é o vocabulário do unilateralismo americano. Mas há um adversário contra o qual o hard power não funciona — e esse adversário atende pelo nome de Luiz Inácio Lula da Silva.
Trump nunca ousou atacar Lula diretamente. Os alvos são sempre outros: o STF, ministros como Alexandre de Moraes, instituições brasileiras, setores econômicos. O cálculo é claro: cada golpe pessoal contra Lula só ampliaria sua estatura global, consolidando-o como antagonista legítimo da extrema-direita mundial. É a lógica invertida da guerra híbrida: ao evitar transformar Lula em mártir ou símbolo perseguido, o trumpismo tenta corroer o Estado brasileiro sem inflar ainda mais a imagem do presidente.
Do outro lado, Lula não dispõe de ogivas nucleares nem de frota naval. Sua força está no soft power: a capacidade de articular alianças, projetar legitimidade, mobilizar discursos de soberania e irradiar esperança. É um poder invisível, mas devastador. Na ONU, no BRICS, no G20, em encontros bilaterais, Lula fala como representante de uma ordem multipolar em construção. Sua biografia — de operário nordestino a líder global — confere à sua voz uma autenticidade que nem mesmo os think tanks mais sofisticados conseguem fabricar.
É esse contraste que explica o silêncio estratégico de Trump. O unilateralismo agressivo dos EUA colide com a imagem de Lula como voz da estabilidade, da soberania e da cooperação. Enquanto Washington distribui tarifas e sanções, Lula aparece como o líder que dialoga com África, Ásia, Europa e América Latina, defendendo inclusão e multipolaridade. Cada ataque direto seria um presente para o presidente brasileiro, que se transformaria ainda mais no fantasma que assombra a extrema-direita global.
No fundo, a batalha entre Trump e Lula não é apenas entre dois líderes. É entre duas ideias de mundo: a da força sem limites e a da soberania compartilhada. E nesse campo simbólico, o Brasil tem um peso que vai muito além de sua economia ou de seu território — tem a legitimidade de ser a voz que ousa dizer “não” ao império.
O coração da disputa: soberania informacional

Por trás de tarifas, sanções e narrativas de lawfare, existe um campo onde a batalha entre Lula e Trump se torna visceral: a informação. A disputa não é apenas sobre commodities ou alianças diplomáticas — é sobre quem controla o fluxo de dados, a circulação de notícias, a formação da opinião pública.
As plataformas digitais são o território decisivo desse embate. Para a extrema-direita global e seus operadores, elas funcionam como trincheiras de guerra cultural: disseminam ódio, fabricam escândalos, legitimam conspirações e corroem a confiança nas instituições. O trumpismo depende de um ecossistema desregulado, onde a mentira circula com a mesma velocidade — ou até mais — que os fatos.
No Brasil, porém, essa lógica encontrou resistência. O Supremo Tribunal Federal, liderado por Alexandre de Moraes, assumiu a dianteira no enfrentamento às redes de desinformação e ao poder absoluto das big techs. E o governo Lula, ao pautar a regulação das plataformas digitais, colocou a soberania informacional no centro da política nacional e internacional. Não se trata de censura, como berram os operadores do bolsonarismo — trata-se de afirmar que o espaço digital não pode ser terra de ninguém, onde empresas estrangeiras e interesses ocultos moldam democracias ao sabor do lucro e da geopolítica.
É por isso que o STF e Moraes viraram alvos preferenciais. Eduardo Bolsonaro lança suspeitas infundadas sobre o patrimônio do ministro; Paulo Figueiredo provoca para que ele prenda um americano; Marco Rubio ameaça com sanções se isso acontecer. Cada peça cumpre uma função: enfraquecer a legitimidade interna do Judiciário, criar pânico institucional e preparar o gatilho para a aplicação da ordem executiva norte-americana.
Nesse ponto, fica claro que a batalha pela soberania informacional brasileira é também uma batalha global. Ao propor regras claras para plataformas, o Brasil oferece um modelo alternativo ao laissez-faire digital dos EUA. Essa agenda ecoa em parlamentos da Europa, no BRICS, na União Africana, em países do Sul Global que enfrentam problemas semelhantes. Lula, ao defender a regulação, não fala só ao Brasil — fala a todos os povos que se recusam a ser governados por algoritmos desenhados em Palo Alto.
Em resumo: enquanto os EUA tentam blindar seus agentes e operações com uma ordem executiva que criminaliza atos soberanos, o Brasil responde com a ideia de soberania informacional — o direito dos povos de controlar suas narrativas, proteger suas instituições e definir as regras do espaço digital. É aqui que a guerra híbrida atinge seu núcleo mais sensível.
2026: o roteiro da desestabilização

As eleições brasileiras de 2026 não serão apenas uma disputa interna. Elas já estão enquadradas como parte de um tabuleiro global em que os EUA, sob Trump, buscam enfraquecer Lula e corroer a democracia antes que o povo vá às urnas. O roteiro está em curso, e combina múltiplas frentes que se retroalimentam.
No plano econômico, as tarifas de 50% impostas em 2025 foram só o início. Sanções setoriais, controles de exportação e atrasos deliberados em licenças tecnológicas funcionam como torniquete silencioso, com impacto direto em cadeias produtivas, geração de empregos e inflação. O objetivo não é apenas punir o governo: é criar insatisfação social que reverbere no ano eleitoral.
No plano institucional, o alvo central é o Supremo Tribunal Federal. Ao sancionar Alexandre de Moraes, Trump transformou um ministro da mais alta corte em inimigo externo, enquanto operadores internos — como Eduardo Bolsonaro — tentam corroer sua imagem com acusações infundadas. Essa combinação cria o ambiente ideal para deslegitimar qualquer decisão que afete redes bolsonaristas ou cidadãos americanos no Brasil.
No plano informacional, a engrenagem é mais evidente. Fake news circulam em escala industrial, campanhas de desinformação são impulsionadas por redes articuladas entre EUA, Argentina, Hungria e Israel, e narrativas de “censura” são fabricadas para atacar a regulação das plataformas digitais. A guerra híbrida é travada nas telas de celulares, corroendo a confiança do eleitor nas instituições e preparando o terreno para a contestação do resultado eleitoral.
No plano político, a estratégia é dividir. O bolsonarismo raiz oscila entre a tentativa de transformar Bolsonaro em mártir e a projeção de Tarcísio de Freitas como candidato viável. Eduardo Bolsonaro, atuando dos EUA como “exilado político”, alimenta a narrativa internacional de perseguição. Paralelamente, uma “terceira via” artificial, encarnada por figuras como Ciro Gomes, pode ser acionada para rachar a esquerda e impedir uma vitória de Lula no primeiro turno.
No plano diplomático, a narrativa de que o Brasil “virou radical à esquerda” já foi lançada por Trump. O objetivo é condicionar a percepção internacional, criando terreno para que, em caso de vitória de Lula em 2026, Washington e seus aliados questionem a legitimidade do processo eleitoral brasileiro. Em última instância, o risco é claro: não reconhecer o resultado das urnas.
Esse roteiro não é improviso: é a aplicação no Brasil de uma estratégia já testada em outras democracias. Criar instabilidade, semear dúvidas, dividir o campo progressista e preparar o terreno para uma narrativa de ilegitimidade. A guerra híbrida de 2026 já começou, e o alvo é a soberania democrática do Brasil.
Conclusão — Entre o golpe e a esperança

A ordem executiva de Trump não é apenas mais um ato burocrático de Washington. É a formalização, em papel timbrado, de uma doutrina perigosa: a de que os EUA podem transformar qualquer ato soberano de outro país em ameaça nacional e responder com sanções, bloqueios e isolamento. É a consagração da ideia de que o império pode tudo, enquanto as democracias do Sul Global precisam pedir licença para exercer sua própria justiça.
No Brasil, essa doutrina encontra um alvo claro: Lula e a democracia que ele representa. Mas a ofensiva não é direta — é indireta, corrosiva, psicológica. Ataca o Supremo, corrói as instituições, tenta fabricar narrativas de corrupção, promove tarifas e pressiona a economia. É o roteiro clássico da guerra híbrida, adaptado ao nosso tempo: tanques substituídos por algoritmos, balas trocadas por sanções, golpes de Estado disfarçados de “defesa da liberdade”.
Mas a história nunca é escrita por uma só mão. Se Trump oferece unilateralismo e coerção, Lula oferece multipolaridade e soberania. Se os EUA assinam decretos que ampliam o medo, o Brasil responde com legitimidade, com a força de uma liderança que se tornou referência global. É nesse contraste que se joga a encruzilhada de 2026.
O império pode até se declarar dono das regras, mas não pode controlar o desejo de soberania de um povo. Proteger Lula e a democracia brasileira não é apenas uma questão nacional: é defender a ideia de que a civilização ainda pode ser construída sobre justiça, diálogo e autonomia dos povos. Entre o golpe e a esperança, o Brasil tem a chance rara de mostrar ao mundo que o futuro não precisa ser ditado pela caneta de um presidente em Washington.




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